O SANTUÁRIO DE SANTO ANTONIO DE BORBA: Um Olhar Histórico

O SANTUÁRIO DE SANTO ANTONIO DE BORBA …
 
A Igreja de S. Antonio de Trocano, hoje cidade de Borba, foi fundada, segundo o padre Serafim Leite, em História da Companhia de Jesus, “ao mesmo tempo que a missão homônima, pelo jesuíta padre João de Sampaio, o maior missionário do Rio Madeira, cujo nome se perpetua na limnografia da região com o Lago do Sampaio ou o lago do Padre Sampaio.”
 
Até 1740, existia Santo Antonio das Cachoeiras, mas, às instâncias dos superiores do Pará, para que fosse a sede das Missões do Madeira transferida para mais perto, já em 1743, surge Trocano, sob o mesmo orago, Santo Antonio. De 1741 a 1743, não há catálogos jesuíticos. Provavelmente, ou desapareceram durante a perseguição pombalina ou depois, pela desídia dos zeladores do Arquivo do Pará (Artur Viana, Anais do Pará IV, p.302) ou talvez não tenham sido escritos no período desses dois anos, visto a incerteza do estabelecimento definitivo nesses anos da sede da missão.
 
Segundo Silva Araújo (pp. 62 e 63), a missão estabeleceu-se provisoriamente depois das Cachoeiras, na foz do Jamari, em Canuã no Ji-Paraná, na foz do Baeta e, por último, em Borba. Em 22 de Janeiro de 1743, falece Sampaio no engenho de Ibirajuba, tendo baixado de Trocano, já alquebrado. Substituiu-o como Superior, o padre Manuel Fernandes. Em 1744 é Trocano sede da missão. Em 1751, padre Aleixo Antonio S.J. trouxe para ela muitas índios do Rio Negro. Já tinha boa casa de residência para os padres.
Em que mês tenha-se dado início aos trabalhos da fachada da igreja, não sabemos. O local da primeira igreja, parece ter sido o mesmo da de hoje e está com a fachada voltada para o igarapé, porto de então, onde ficavam em seguro as canoas e outras embarcações.
 
A igreja atual, porém, não é mais a primeira, construída pelos jesuítas nem a que talvez fosse edificada para Matriz, quiçá por ordem de Mendonça Furtado.
 
D. Frei Caetano Brandão, bispo do Pará, que de 19 a 21 de setembro de 1788, esteve em Borba, em visita pastoral, referindo-se à igreja escreve em suas Memorias: “A mesma Igreja está coberta de palha, as paredes esburacadas e negras; o pavimento de terra solta; os altares nus e com bastante indecências, pobríssima de ornamentos e alfaias”.
 
No tocante à igreja espiritual diz: “Em tudo a mesma deformidade…”. Nos assentamentos de batizados de outubro de 1838 até 1840, lê-se: “na paroquial igreja do glorioso Santo Antonio de Araretama.” Atenuados os estos de nacionalismo exaltado, que por alguns anos grassou por toda a Amazônia, Borba voltou a ser chamada pelo seu antigo nome. Assim, no fim dos assentamentos de 1840, o Visitador Silva (não sabemos se regular ou se diocesano), escreve: Visto em ato de visita… Borba, 18 de maio de 1840.
Nos assentamentos de batizados até 28 de maio de 1853 o Vigário Colado Antonio Ferreira da Silva Franco escreve: “nesta paroquial Igreja de Santo Antonio de Borba.” Em 25 de junho do mesmo ano, de 1853, o mesmo vigário escreve: “em uma capela ereta, em casa particular, por se achar, a Matriz arruinada… logo no seguinte assentamento, feito aos 30 de agosto de 1853, o mesmo vigário colado escreve: “em a casa que serve de Matriz”. Em 23 de dezembro de 1869 ocorre o primeiro assentamento: “nesta paroquial igreja de Santo Antonio de Borba.” O vigário interino, padre Francisco Benedito da Fonseca Coutinho.
 
Em 1861, o engenheiro J. M. da Silva Coutinho, no relatório sobre alguns lugares da província do Amazonas, especialmente do Rio Madeira, tratando de Borba, escreve: “A Matriz atualmente em construção tem 50 palmos de frente, por 150 de fundo. Serve de matriz uma casa particular, acanhada, com alpendre para poder acumular os fieis… há por enquanto a coberta de telha e os moirões formando o esqueleto das paredes. O teto foi mal construído e, por isso, abateu em alguns pontos. Aconselhei ao vigário, que mandasse fazer 4 tesouras para evitar a ruína de todo o edifício”… De fato a igreja atual é muito larga, para o telhado.
Mons. Coutinho, anos depois da estada do engenheiro J. M. da Silva Coutinho, a fim de evitar a ruina da igreja, mandou construir arcadas de boa alvenaria pelo mestre português Antonio Joaquim Pereira, que faleceu em Borba a 11 de fevereiro de 1939.
 

O mesmo engenheiro Silva Coutinho, diz que viu em Borba os grossos alicerces de uma Igreja que os jesuítas começaram, mas que não foi concluída… e continua: “o fato de não concluir-se a igreja, parece provar que os jesuítas estiveram em Borba até a sua extinção, no Brasil. Mais uma prova de que a igreja atual não é a primeira dos jesuítas.”
 
Até 1755, pertenceu a igreja de Borba aos jesuítas, mas investido Mendonça Furtado, por Carta Regia de 3 de março de 1755, do poder de criar a Capitânia de São José do Rio Negro, hoje estado do Amazonas, e de elevar à categoria de Vila a aldeia de Trocano, o que fez em janeiro de 1756, dando-lhe o nome de Borba, a Nova, iniciou uma feroz perseguição contra os beneméritos jesuítas.
O superior da missão, Anselmo Eckart, retirou-se para a aldeia de Abacaxis onde residia seu irmão de hábito, o padre Runderfela. Da igreja dos jesuítas existem, ainda, uma imagem de São Francisco Xavier e uma outra do Crucificado. Esta última foi reincarnada no ano de 1938. O engenheiro Silva Coutinho as viu em 1861.
 
Com a retirada dos jesuítas, passou Borba para os Carmelitas. Frei André Prat (vol. 1 p.35), na sinopse dos lugares e aldeamentos dos índios, fundados e cristianizados pelos Carmelitas, traz: do Rio Madeira, Borba. Ano da fundação: 1755.
 
No mesmo volume, p.50, frei Prat cita o capitão Antonio José Landi, arquiteto da igreja do Carmo de Belém… Sua eccelencia (Francisco Xavier Mendonça Furtado) mi condusse con se alla fondanzione della Villa di Borba, posta nel Rio Madeira. Nel principio de genaio de 1756 ritorniano a Mariuá. É provável que Mendonça Furtado tivesse trazido consigo carmelitas de Barcelos (Mariuá), para substituir os jesuítas em Borba, e que a Ordem do Carmo tenha aceito a missão de Borba em 1755.
 
Na Matriz de Borba existe, ainda, um triângulo para o ofício das Trevas, que só pode ter sido dos carmelitas, visto os jesuítas não rezarem o Ofício no Coro. Deve também ter sido dos carmelitas uma pequena imagem de N. S. do Carmo, existente na Sacristia. Os carmelitas, porém, não ficaram sempre efetivos em Borba. O que se conclui, à luz dos documentos, é que os carmelitas ficaram com a missão do Madeira, sendo, porém, o vigário da paróquia até 1838, um clérigo secular. Nem era permitido que os frades fossem párocos.
 
Em Borba faleceu e foi sepultado (provavelmente na igreja, conforme o costume da época), frei José das Chagas, apóstolo da Mundurucânia, fundador de Parintins, Canumã, São José do Matari, Sapucaioroca. Era homem de vida santa e abnegada. Veja-se cônego Bernardino de Souza, na comissão do Madeira (2ª parte, pp. 28 e 83). Também, em Borba, faleceu em 28 de maio de 1838, o segundo de nome, frei José Alves das Chagas.
 
Foi quem abençoou o casamento do maior herói brasileiro do Amazonas, Vitor da Fonseca Coutinho com dona Izabel da Fonseca Zuzarte, em 10 de junho de 1832. Era o alferes Vitor da Fonseca Coutinho, coronel comandante superior da Guarda Nacional, filho do capitão Francisco Benedito da Fonseca Coutinho e dona Ana de Goes. Nasceu o alferes Vitor, em 12 de abril de 1812. Foi batizado na Igreja de Borba. Teve do seu casamento 11 filhos, um dos quais, foi monsenhor Francisco Benedito da Fonseca Coutinho.
 
Com a morte de frei José Alves das Chagas, foi nomeado em 1838, superior da missão de Borba o carmelita frei José (ou Vicente) de Carvalho Pena (Frei André Prat, v. II, p. 64.). Parece que nesse ano de 1838 foi extinta a Missão, pois o Livro dos Batizados de 21 de outubro de 1838 a 14 de março de 1840, traz assinado: “Vigário interino — José Vicente de Carvalho Pena”, que só pode ser o mesmo frei José (ou Vicente) de Carvalho Pena.
 
Depois deste, regeram a paróquia até dezembro de 1863 cinco vigários, por espaço de 23 anos, sempre por pouco tempo. O padre Paulino dos Santos Ferreira Mar, sucessor do frei Pena, foi trêsvezes vigário e cada vez por poucos meses. Em agosto de 1847, houve visita pastoral, feita pelo bispo do Pará, D. José Afonso de Moraes Torres. Desta, como de diversas outras vezes, estava Borba sem vigário, pois ocorrem atos paroquiais feitos pelo Vigário-geral Antonio Manuel Sanches de Brito e pelo secretário cônego Antonio dos Reis de Macêdo. Pelas determinações e proibições feitas por escrito pelo bispo, vê-se que não era muito edificante o estado da paróquia.
 
Depois de D. José [Afonso], estiveram na Matriz de Borba, em visita pastoral, o bispo-mártir D. Antonio de Macêdo Costa, D. José Lourenço da Costa Aguiar, primeiro bispo do Amazonas, D. Frederico Costa, D. João Irineu, D. Basílio Pereira e D. João da Mata.

De 1847 a 1863, regeram a freguesia 3 vigários. Apenas um colado, permaneceu 10 anos. Em dezembro de 1863, aparece, pela primeira vez, a assinatura do Pe. Francisco Benedito da Fonseca Coutinho que, em 1869, assina: o Vigário, interino, P. Francisco Benedito da Fonseca Coutinho. Por quanto tempo e quantas vezes, foi monsenhor Coutinho vigário de Borba, até agora não se conseguiu achar. Durante deste grande brasileiro e ínclito chefe político de Borba, esta paróquia esteve vaga diversas vezes e não por pouco tempo. Em 1900, monsenhor Coutinho pede provisão de vigário de Borba e obtém de monsenhor Hipólito Costa.
 
Dez anos depois, a 6 de janeiro de 1916, com 82 anos, tendo recebido todos os sacramentos, faleceu em casa do seu irmão Vitor da Fonseca Coutinho, casa que hoje é propriedade do município e residência dos prefeitos. Monsenhor Coutinho foi por diversas vezes deputado estadual e, de 2 de dezembro de 1903 a 2 de abril de 1904, Governador do Amazonas. Foi sócio correspondente da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro. O diploma assinado em 3 de novembro de 1900 pelo presidente, Marquês de Paranaguá, está no arquivo da Matriz de Borba.
 
Foi o primeiro vigário-geral da diocese de Manaus, por provisão do bispo D. José Lourenço da Costa Aguiar, passada em 19 de junho de 1894. O documento está no arquivo da Matriz. Durante toda a sua vida, foi Borba a primeira Vila e um dos lugares de mais importância do Amazonas, tinha até Mesa de Rendas.
 
Promoveu a instrução no município. Ainda hoje encontramos caboclos velhos, cuja caligrafia causa inveja. Como sacerdote foi muito zeloso da igreja de Santo Antonio e do culto divino. A Matriz atual é obra dele e de sua família. Dotou-a do que melhor havia na época. Monsenhor Coutinho também cometeu erros, basta ter sido político: “Quem não era Coutinho, dizem, era coitadinho”, mas, também, deixou uma memória abençoada.
 
Borba, atualmente em decadência, com uma população de 400 almas, possui uma das maiores e das mais belas igrejas do Amazonas, com boas alfaias, bonitos paramentos, grandes e lindas imagens. O Senhor Morto de 1,70m comove. O Coração de Jesus, de 1,20m é, talvez, a mais bela imagem da diocese. A Igreja de Borba é um lugar querido de Deus. Todos os que nela entram, sentem-se envolvidos por um ambiente de piedade e unção.
 
Estão eretas na matriz o Apostolado da Oração, agregado em 5 de junho de 1937, a Arquiconfraria do Rosário, canonicamente fundada em 5 de julho de 1938, e a Pia União de Santo Antonio, instituída em 1940.
 
Sendo a Igreja de taipa, com os anos algumas paredes abateram. Ocorrendo o 2° centenário de Borba e de sua elevação à Vila (1755 a 1955 e 1756 a 1956), para comemorar dignamente essa data histórica, o vigário iniciou a restauração da secular Matriz, marco mais antigo do Cristianismo e da civilização do Rio Madeira e talvez do Amazonas.
 
A fachada principal quase pronta, estaria ladeada por duas altas torres se não fosse a carência do material. Do mesmo modo, a fachada lateral do poente com o transepto e a cúpula, remate e coroa do edifício estariam adiantados se além da falta de material e de transporte, não houvesse tudo encarecido espantosamente.
 
Confiando na Divina Providência e na proteção de Santo Antonio. Todos têm como certo que nas festas bicentenárias de 1955 e 56, Borba possuirá a mais bela igreja do interior do Amazonas.
ASSINADO: Pe. Bento José de Souza.
Vigário de Borba.
 
 
 
Créditos: Roberto Mendonça, Blog do Coronel, folheto Histório da Igreja de Santo Antonio de Borba,
Imprensa Oficial, Manaus, 1946.